Skip to main content

Empreendedores, com seu espírito de liderança, sempre desbravaram novas fronteiras e carregaram as principais transformações econômicas e culturais da humanidade. Foi assim com o surgimento da burguesia (que tirou a humanidade da “idade das trevas” medieval), com a Revolução Industrial (promotora de desenvolvimento e geração de valor) e, agora, com o seu tão temido quarto estágio — em que a inteligência artificial, em conjunto com a capacidade de integração e aceleração das comunicações em rede, parece colocar em risco todas as certezas sobre as competências e as vantagens competitivas construídas nos negócios, muitas vezes ao longo de gerações.

Muitos também já despertaram para a consciência dos impactos sociais e ambientais, positivos ou negativos, causados pelos seus negócios — bem como para a oportunidade de transformar temas socioambientais em valor —, mas ainda não encontraram ferramentas para melhor direcioná-los e mensurá-los. Portanto, mesmo conscientes, não conhecem parâmetros de comparação com outras empresas, local ou globalmente, o que dificulta a tomada de decisões concretas e efetivas.

Fato é que o mundo dos negócios está em profunda transformação, seja pelo desenvolvimento tecnológico e científico ou pelo desenvolvimento da consciência de que todos são interdependentes e interconectados.

Serão cada vez mais necessários o desenvolvimento de novas competências e a capacidade de adaptação a um mundo em que a incerteza é a regra e os conceitos de competição não estão mais tão claros. Clientes, fornecedores, colaboradores, recursos naturais, governantes, gestores, todos são parte de um enorme e sutil tecido social, econômico e ecológico, que parece ressaltar em cores vibrantes o verdadeiro significado do radical grego eco: todos moram em uma mesma casa.

As empresas B integram um movimento global de ativismo empresarial. São líderes inconformados. São empreendedores cada vez mais conscientes, que optam por conciliar lucro com impacto socioambiental positivo na definição de seu modelo de negócio. Sem a pretensão de serem empresas perfeitas, elas assumem o protagonismo nessa jornada rumo a uma nova forma de se fazer e de se entender o papel dos negócios, resgatando a cultura de desbravamento que sempre pautou o empreendedorismo ao longo da história da humanidade, mas agora mais consciente e inclusiva.

Da filantropia ao ativismo

Impactos social e ambiental não são assunto novo para as empresas. Pode-se entender que o primeiro passo foi consolidado a partir da década de 1990, mais fortemente após a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Eco 92. Nesse período, o mundo empresarial buscava principalmente causar impacto positivo social ou ambiental por meio das instituições e fundações de famílias ligadas ao controle das corporações. Embora tenha sido e ainda seja muito importante para que se saia do estado de torpor, o fato é que na maioria das vezes esse caminho mostrou-se desconectado da estratégia dos negócios; não evitou grandes catástrofes ambientais, sociais, de integridade e ética causadas pela operação de empresas, com relevantes perdas no valor econômico dessas corporações.

A partir da década de 1990 observou-se no mundo todo a criação de numerosos padrões, iniciativas, normas, referências e diretrizes que tratam das práticas empresariais em relação a ética, desempenho socioambiental e qualidade dos relacionamentos com os diversos stakeholders1. Muitos desses instrumentos exercem influência importante sobre as empresas, as políticas públicas e os instrumentos regulatórios.

Na década seguinte, a comunidade internacional passou também a estabelecer um padrão de regras internas que impactou profundamente as multinacionais, com seus executivos sendo responsáveis pelas decisões operacionais nos países em que operavam. Essas regras rapidamente se disseminaram até chegarem às áreas social e ambiental. Trata-se da ampliação da gestão de riscos e compliance, em que o foco foi criar um sistema de governança como instância de controle operacional e de mitigação de riscos — o que também contribuiu, assim como a filantropia, para o incremento do impacto positivo socioambiental.

Entretanto, parece não ter sido suficiente. Apesar dos sinais de que tudo caminhava na direção correta, os resultados agregados ainda não acompanhavam as mudanças nas necessidades dos indivíduos e do planeta. Torna-se, portanto, imprescindível o constante fortalecimento das ações conjugadas entre os indivíduos, os governos, a sociedade civil, os organismos multilaterais e o setor produtivo para que a velocidade das transformações necessárias seja alcançada e efetivamente proporcione um mundo melhor para todos, fazendo emergir uma nova consciência.

Em setembro de 2015, os 193 países membros da ONU validaram a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, que contém um conjunto de 17 indicadores denominados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs). Eles orientam, de forma equilibrada, as três dimensões do desenvolvimento sustentável: a econômica, a social e a ambiental. Para acompanhar o cumprimento dos ODSs junto ao setor produtivo, a ONU acaba de anunciar uma parceria com o Sistema B, para a utilização da ferramenta criada para a certificação das empresas B.

Consumidores e colaboradores também anseiam por negócios sustentáveis e com propósito genuíno. É a vez do ativismo empresarial, conectado às estratégias de negócio. E para comunicar de maneira efetiva essa intenção, surgem os selos de certificação, dentre eles o do Movimento de Empresas B.

As empresas B se comprometem com o protagonismo nessa transição cultural rumo a negócios bons para as pessoas, para as finanças e para o planeta.

Nesse cenário, agrega-se à gestão de riscos as importantes tarefas de se cuidar e proteger os valores, a missão e o propósito do grupo empresarial. Ao final do dia, são os guardiões da longevidade da empresa. As empresas B pretendem ser as melhores empresas para o mundo porque têm consciência do valor desse ativismo genuíno para a identidade e para a longevidade dos seus negócios. E, de quebra, transformam sua cultura em seu principal ativo, atraindo e mantendo talentos, criando espaço para inovação e transformações contínuas, gerando resiliência e adaptação ao ambiente de negócios em constante mudança.

Os efeitos dessa cultura estão sendo percebidos como um enorme valor para acionistas e investidores. Larry Fink, CEO e fundador da gigante BlackRock Investments, escreveu uma carta a todos os CEOs do mundo, em janeiro deste ano, em que informa uma mudança de rumo em seus investimentos de US$ 6,3 trilhões, para aumentar a participação de empresas que gerem impacto positivo, até chegar à totalidade do portfolio no médio prazo.

O livro Firms of Endearment, de coautoria de Raj Sisodia, cofundador do Movimento Capitalismo Consciente, faz um profundo estudo que comprova que empresas americanas listadas em bolsa e que desenvolveram o propósito em seus negócios obtiveram uma valorização maior que 1.500% em comparação com seu benchmark S&P no longo prazo. A pesquisa foi feita entre os anos de 1998 e 2013.

Neste ano de 2018, a Danone North America se tornou a maior B Corp do mundo, com faturamento superior a US$ 6 bilhões. Seu CEO, Emmanuel Faber, anunciou que pretende certificar todas as subsidiárias globais até 2020. Os projetos sociais, ambientais e as novas linhas de produtos demonstram a guinada estratégica dessa gigante do ramo de alimentos. Outra multinacional importante, a Unilever, já adquiriu cinco B Corps globalmente, incluindo a icônica Ben&Jerry’s e a brasileira Mãe Terra.

É evidente que alguns empreendedores não somente despertaram para o assunto, mas já estão agindo consistentemente no caminho B.

Movimento Global de Empresas B

O Movimento Global de empresas B nasceu em 2006 nos Estados Unidos, quando três executivos decidiram criar uma certificação para reconhecer empresas com o compromisso de serem as melhores para o mundo.

Hoje existem cerca de 2,5 mil B Corps, nos cinco continentes, em praticamente todos os segmentos econômicos. A certificação é feita pelo BLab, organização sem fins lucrativos localizada na Filadélfia, nos Estados Unidos. Há escritórios em todos os continentes. No Brasil, o movimento é representado pelo Sistema B, organização sem fins lucrativos.

As empresas interessadas podem acessar o questionário de avaliação de impacto (www.bimpactassessment.net) e fazer sua medição gratuitamente. Essa ferramenta mede impacto em cinco diferentes dimensões: governança, meio ambiente, colaboradores, comunidade e cadeia de valor, de maneira a avaliar o nível de transparência, responsabilidade e propósito de suas operações. Uma vez submetido o questionário para certificação há uma auditoria dos analistas do BLab; mantendose a pontuação mínima necessária, a empresa está pronta para a certificação.

Nem todas empresas comprometidas e ativistas precisam ser certificadas. A certificação é um processo rigoroso, que envolve reavaliação a cada dois anos. Para as empresas, o processo é uma longa jornada, cujo caminho é tão importante quanto a certificação. Muitas companhias, em especial as familiares e multinacionais, têm optado por utilizar o BIA (B Impact Assessment) como ferramenta de gestão para a medição de impacto e como referência de boas práticas em nível global.

Para casos especiais, em que organizações necessitam uma maior sensibilização de seus executivos e engajamento de seus funcionários, o Sistema B desenvolveu um programa especial: o Caminho +B, que inclui uma série de workshops em que a equipe especializada do Sistema B facilita a realização do BIA junto aos colaboradores na medição de impacto em suas cinco dimensões — sensibilizando, apoiando e, sobretudo, apresentando um benchmark com práticas adotadas em empresas B no mundo todo.

A escolha do caminho em que se seguirá empreendendo é uma escolha do que se deseja deixar de legado para as próximas gerações. Uma escolha do que se quer nutrir, na semente que se pretende plantar. Esse caminho é que concretizará os aprendizados para que todos vivam conscientes da interdependência. Sua linha de chegada — a certificação — é apenas a coroação, a certeza de que se está fazendo o melhor possível para o mundo. Afinal, as B Corps pretendem ser as melhores empresas para o mundo, além de redefinir o conceito de sucesso nos negócios, na vida e na economia.

Guilherme Rodrigues
COO do Sistema B Brasil, Co-Founder da empresa B Aquatro Cultura de Impacto. Pai de Mariana e Gustavo, amante do Mar. Especializado em Auditoria pela USP e Master in Business Administration pela University of Pittsburgh.

Gabriela Baumgart
Embaixadora do Movimento de Empresas B no Brasil, mãe, executiva, mentora e Conselheira e membro do Comitês de diversas empresas nacionais. Preside a Comissão de Empresas Familiares do IBGC. É bacharel em Direito pela USP, pós-graduada em Administração de Empresas pela FGV e pela Harvard School of Business.

Maria Cecília Gonçalves
Embaixadora do Movimento de Empresas B no Brasil, mãe, executiva, mentora, Conselheira e membro de Comitês de diversas empresas nacionais. Preside a Comissão de Empresas de Controle Familiar do IBGC. É bacharel em Direito pela USP, pós-graduada em Administração de Empresas pela FGV e pela Harvard School of Business.

Tarcila Reis Ursini
Mãe do Vittorio e do Filippo, artista amadora nas horas vagas, conselheira e membro de Comitês de Conselho de empresas e de organizações da sociedade civil. É professora na pós-graduação da FIA. É membro das comissões de Inovação e de Sustentabilidade do IBGC. É bacharel em Economia pela USP, em Direito pela PUC-SP, com mestrado em Desenvolvimento e Direito pela Universidade de Londres.

Leave a Reply